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Já ouviu falar do 7 Orelhas? Antigo justiceiro nasceu em Jacuí

Numa terra onde olho por olho e dente por dente era a justiça, o bárbaro assassinato de um fazendeiro desencadeou a morte de sete irmãos.

Amarrado a uma figueira, João Garcia Leal, de 43 anos, foi despelado vivo, depois de uma disputa com um vizinho pela demarcação de terras.

Sedento por vingança seu irmão Januário Garcia Leal (1761-1808), considerado um homem bom e trabalhador, jurou vingança e seguiu os criminosos território mineiro afora, eliminando um a um. Sua marca registrada era uma orelha que cortava do homem “justiçado” depois a salgava e a pendurava em um cordão. Não demorou muito para ser conhecido como Sete Orelhas. A história já foi tema de filme e inúmeras obras literárias, teria se passado onde hoje é uma propriedade particular em São Bento Abade (MG). O local é tombado pelo município.

Mais do que trazer à tona a violência nos rincões do Brasil colonial, terras sem lei e gente para fazê-la ser cumprida, a saga do personagem trata da ocupação de Minas no século 18. Os antepassados de Januário emigraram do Arquipélago dos Açores, pertencente a Portugal, e se instalaram primeiro na capitania e em São Paulo. Em seu livro Jurisdição dos capitães – A história de Januário Garcia Leal, o Sete Orelhas, e seu bando, o promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda, integrante também do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, conta que as raízes, formação étnica e costumes da maioria do povo das Gerais estão nos Açores. 

“Ao açoriano cabe a primazia de ter sido o nosso colonizador, o nosso desbravador, foi aquele bravo que fixou as nossas fronteiras, matou e morreu pela preservação da nossa integridade territorial”, diz Marcos Paulo, destacando outra característica dos ilhéus que os distinguiam dos portugueses, mais preocupados com o brilho do ouro. “Os açorianos cultuavam tradições, reveladas nas festas do Espírito Santo, Divino e folia de reis. Tinham espírito festeiro e transmitiram isso aos descendentes, deixando como legado as rodas de fiar, os teares domésticos para se fazer colchas de lã, o carro de boi mineiro e os doces caseiros.

Mas toda essa alegria não foi suficiente para aplacar a ira de Januário, homem branco, possuidor de vários bens e pertencente a uma das famílias mais tradicionais do Sul de Minas, ao descobrir a morte do irmão – de acordo com os relatos históricos, ele teria visto, do alto de um morro, a trágica cena de João Garcia tendo a pele retirada, ainda vivo, pelos filhos do fazendeiro Francisco Silva. Abandonou a mulher e o filho, Higino Garcia Leal, e começou a sua caçada pelos sertões, que duraria seis anos.

Pertencente a uma das famílias mais tradicionais do Sul de Minas, ao descobrir a morte do irmão, em cima de um morro observou a trágica cena de João Garcia tendo a pele retirada, ainda vivo, pelos filhos do fazendeiro Francisco Silva. Abandonou tudo e começou sua caçada pelos sertões, que duraria seis anos.

Januário adotou como primeira providência apelar para as autoridades, em São João del-Rei, sede da comarca do Rio das Mortes. Sem sucesso, devido à inércia do Poder Judiciário colonial, decidiu fazer justiça com as próprias mãos, seguindo a Lei de Talião: “Morte aos matadores”. 

A história do Sete Orelhas passou de geração em geração e, na infância em Andrelândia, no Sul de Minas o promotor de Justiça a escutou muitas vezes, contada pelos avós. Marcos Paulo, decidiu estuda-la a fundo. “Pesquisei a genealogia em São João del-Rei e encontrei também documentos em Portugal e no Arquivo Público Mineiro, descobrindo que aquilo que parecia lenda era realidade.” Um exemplo: “Em 1803, uma moradora da Freguesia de Campo Belo, então subordinada à Vila de São Bento do Tamanduá, hoje Itapecerica (MG), fez representação ao governo português contra o Sete Orelhas. No documento, ela cita ‘uma fiada de orelhas’ usada pelo justiceiro”. 

O promotor localizou em Lages (SC) o auto de corpo de delito e o inventário de Januário, nascido em Jacuí (MG). Depois de anos de caça aos assassinos, ele seguiu para a cidade catarinense, vivendo como comerciante sob proteção de parentes, já que a colônia açoriana era grande naquela região. Curiosamente, morreu com uma pancada na altura da orelha, depois que a madeira de um curral o acertou. 

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